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Renata Fortes

Porto Marítimo em Torres/RS, o que está em jogo?


Imagem Torres/RS

“Sonho em um dia ver cruzeiros marítimos com turistas desembarcando na nossa orla, cargas saindo daqui pra qualquer lugar do mundo. Sonho em ver o Litoral se desenvolver muito mais do que se desenvolve hoje em virtude da falta, muitas vezes, de investimento privado que nós tanto buscamos”, palavras do deputado estatual Gabriel Souza (MDB) na audiência pública realizada dia 06 de maio em Torres, sobre a instalação de um porto marítimo particular.


Este sonho faria algum sentido na década de noventa quando os brasileiros ainda eram iludidos sobre a construção de portos como ferramenta de geração de emprego em cidades litorâneas, quando no Brasil havia um crescimento econômico em vista e, por fim, quando o meio ambiente ainda não estava tão destruído como agora.


Para entender o custo-benefício da construção de um porto, pode-se afirmar que o benefício fica com o Estado, e o custo com a cidade na qual o porto será construído. Logo, pensar em gerar emprego e renda nos dias de hoje pela construção de um porto, é demonstrar a incapacidade do gestor público em avançar na busca de projetos inovadores, como àqueles que contemplam preservação ambiental e sustentabilidade urbana.


No caso do porto de Torres, pelo que temos lido e ouvido parece que nem o Estado se beneficiará, uma vez que não há demanda para mais um porto no Rio Grande do Sul, e afirmar, como fez empresário o Sr. Ruben Bisi, representante do Movimento Mobilização por Caxias (Mobi), de que a construção do porto não está baseada na demanda atual de carga, já que insuficiente para justificar a obra, mas como o porto levará dez anos, o olhar é para o futuro, parece ter sido a fala mais realista e temerária da audiência. Realista porque admite que não há demanda de carga atual, e temerária porque aposta em uma demanda para daqui a dez anos desconsiderando a incerteza gerada pelos novos rumos na economia nacional e mundial. Estamos em um momento de transição social, política e econômica no mundo, e o recomendável é apostar no aqui e agora.


Geralmente quem preside as audiências públicas para grandes obras apresentam o paraíso, projetando no imaginário das pessoas uma mudança radical em suas vidas, a partir da grande oferta de empregos e geração de renda na cidade. Mas, a realidade é outra bem diferente. A cidade incha com a chegada dos trabalhadores, com ou sem família, que transitam pelo Brasil em busca de vaga de trabalho. Há uma imediata demanda por mais centros de saúde, escolas, moradia e segurança pública. Foi apresentado em audiência o número de trabalhadores que será necessário para a obra, em cada estágio? Estas pessoas são contratadas temporariamente pela empresa construtora, ao final da obra estão, novamente, desempregadas.


Que empregos serão ofertados pelo Porto depois de pronto? Isso é importante ser esclarecido. Qual o incremento financeiro na cidade, existem dados a serem expostos a exemplo de outras cidades, mas a fala é sempre genérica.


Sob o ponto de vista ambiental, não existem portos sustentáveis e ecológicos. O impacto ambiental, principalmente, na fauna marinha é expressivo, ainda mais na região que é rota migratória da baleia franca austral, espécie ameaçada de extinção e que tem seu berçário no estado vizinho, Santa Catarina.


O trânsito de navios com cargas tóxicas e poluentes, é outro fator a ser considerado porque os navios são lavados para receber novas cargas. No Porto de Imbituba/SC, pescadores artesanais denunciaram em 2018 o despejo dessa água na própria enseada, quem fiscaliza?


Agora, se realmente houvesse uma análise responsável sobre este empreendimento na cidade de Torres, que vive intensamente do turismo de verão, só o risco de um derramamento de substância tóxica no mar, que pode comprometer as praias, já seria suficiente para a Prefeitura e Deputados Estaduais sequer cogitarem esta obra na região. Mas, o que vemos no Brasil são os políticos sempre apostando no caminho mais fácil para eles administrarem, sem inovação, sem novas tecnologias, enfim, sem criatividade.


O que está em jogo na construção deste porto? A qualidade de vida dos moradores e veranistas de Torres, o equilíbrio socioambiental da região e, por fim, o desenvolvimento sustentável urbano que, apenas para relembrar, significa o desenvolvimento com base na vocação do território.


Os problemas que Torres enfrentam não serão solucionados com grandes e impactantes obras, mas com administradores públicos inovadores que promovam a cidadania participativa, que tornem a cidade acolhedora e ordenada, que tragam atrações culturais importantes no cenário nacional e mundial, desenvolvam a economia local com base em princípios sustentáveis criando um diferencial para o lugar, que saibam dar a devida importância para os atrativos ambientais da região, e, principalmente, se informem sobre Programa Cidades Sustentáveis.


Torres possui vocação para o turismo, e o que vemos acontecer para que esta vocação promova a sustentabilidade da cidade? Não existe milagre econômico para as cidades, o que existe é o trabalho administrativo de qualidade, diariamente.

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